Poema: Amar de Carlos Drummond de Andrade

Um dos meus escritores brasileiros preferidos, sem dúvida um dos maiores que nossa terra já teve. Aproveita e veja também a Antropologia poética do mestre clicando no link - https://amzn.to/2Wb5Zcx

AMAR - Carlos Drummond de Andrade.

Que pode uma criatura senão
Entre criaturas, amar?
Amar e esquecer, amar e malamar
Amar, desamar, amar?

Sempre, e até de olhos vidrados, amar?
Que pode, pergunto, o ser amoroso
Sozinho, em rotação universal, senão
Rodar também, e amar?

Amar o que o mar traz à praia
O que ele sepulta, e o que, na brisa marinha
É sal, ou precisão de amor, ou simples ânsia?
Amar solenemente as palmas do deserto

O que é entrega ou adoração expectante
E amar o inóspito, o áspero
Um vaso sem flor, um chão de ferro
E o peito inerte, e a rua vista em sonho
E uma ave de rapina

Este o nosso destino: Amar sem conta
Distribuído pelas coisas pérfidas ou nulas
Doação ilimitada a uma completa ingratidão
E na concha vazia do amor à procura medrosa

Paciente, de mais e mais amor
Amar a nossa falta mesma de amor
E na secura nossa, amar a água implícita
E o beijo tácito, e a sede infinita

Tags :

Nenhum comentário:

Postar um comentário