Filosofia: A tecnologia que fere o espírito

Filosofia: A tecnologia que fere o espírito

O mundo é um lugar difícil, você há de concordar que os momentos de paz e harmonia são adquiridos em troca de um esforço contínuo, o que não necessariamente nos parece justo. Isso nos torna emocionalmente dispostos a ceder a vícios que nos façam acalmar os sentirmos minimamente satisfeitos. E o mundo constantemente nos oferece uma variedade grandiosa de vícios para esse fim. Um dos mais predominantes e generalizados da atualidade, que tem o benefício de não ser mal visto socialmente é o excesso de entretenimento. 

Nós estamos tão viciados no entretenimento que não temos paciência para desenvolver trabalhos complexos e demorados na maior parte das vezes, e mesmo quando fazemos, nos preocupamos se o público se dará o tempo e a paciência de apreciar este trabalho de forma apropriada. Para muitos de nós, principalmente os nossos jovens, mesmo ler um texto tão curto como este pode ser um desafio à paciência.

Isso é um vício, como todos os outros, nos ataca direto nos instintos, programa nosso subconsciente sem que nos demos conta, e o resultado é que procuramos entretenimento em tudo o que fazemos. Quando temos cinco segundos livres, usamos para abrir o celular e procurar um vídeo que seja divertido. Estamos sempre a procura de novas séries, jogos ou músicas, e a nossa tecnologia nos leva a conseguir essa satisfação tão rápida e temporária de forma completamente independente e individual. O resultado é que aos poucos, estamos perdendo a habilidade de entreter uns aos outros.

Nós tentamos, contamos histórias a todo momento, os melhores momentos, como é o nosso dia a dia, o que gostamos, o que vemos, o que achamos sobre as coisas, mas não foi sempre assim. Um esforço contínuo em nos identificar para os outros, de mostrar o que somos, do que gostamos, como entendemos as coisas, o que achamos, em uma expectativa de que o interlocutor será fascinado pelo que temos dentro de nós, e a verdade é que estamos cada vez mais vazios. Quanto mais o mundo nos preenche com conteúdos fáceis de ser compreendidos e simples, menos nós desenvolvemos os nossos próprios conteúdos, menos nós temos a oferecer aos outros.

Hoje, mesmo aquele que aprende algo interessante na faculdade, ou decide por transmitir um pensamento interessante a alguém se sente constrangido, por que esse não é um comportamento de entretenimento, e esse novo “ser chato” é um crime que nós pouco suportamos na nossa sociedade.

Reflexo do peso do esforço que as responsabilidades lançam sobre nós continuamente. Mesmo alguns de nós, quando estudamos algo que amamos, fazemos isso com pouco tempo disponível, e com muito mais exigência do que sentimos dar conta, de forma que ao final do semestre, o que menos queremos saber é daquilo que antes tanto nos interessava.

E o mais triste é que o tempo se esvai tão rapidamente como o vento corre. Não vemos o tempo chegando, não o vemos ir embora, apenas sentimos como ficamos cada vez mais velhos, sem paciência, mais desgostosos por nunca termos tentado algo diferente.

No passado, quando nem mesmo televisões eram uma mídia de comunicação popular, nós tínhamos tempo a se desenvolver em habilidades. Aprendíamos a praticar um esporte, tocar um instrumento, desenvolver uma paixão qualquer que fosse, das mais variadas, desde colecionar revistas sobre motocicletas, fazer artesanato, ler sobre um determinado assunto até mesmo praticar um esporte incomum, como xadrez profissional ou bocha.

Não temos mais que buscar por satisfação, ela nos é oferecida mais rápido do que podemos consumir, e nós estamos morrendo por dentro. A nossa habilidade de ter paixão pelas coisas, e até pelas pessoas está sumindo. Somos cada vez mais iguais, mais comuns, nos desenvolvemos cada vez menos e de forma menos diversificada.

Não é de se espantar que a todo momento falemos de como somos, do que achamos ou do que gostamos. Estamos deixando de ser capazes de nos identificar para nós mesmos, então constantemente tentamos nos identificar para os outros.

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