Como começou o tráfico negreiro

Como começou o tráfico negreiro

No ano de 1453, mais de mil anos depois de sua separação do Império Romano do Ocidente, o Império Bizantino veio a cair na mãos do Império Turco Otomano, durante sua expansão islâmica.


Sua capital, então chamada Constantinopla, tinha o formato mais estratégico da história. Duas pontas de terra, apontadas uma para a outra com um punhado de água no meio.

Esse punhado de água era o único caminho pelo qual os navios mercantes europeus podiam passar, para em seu caminho comercializar com a India, onde o dinheiro estava, sem precisar dar a volta na África.

A ponte estava fechada agora, e os portugueses, até então alguns dos mais fortes no comércio e na batalha naval, trataram então de dar um jeito de dar a volta na África.

Ao longo da costa da África, abaixo do Saara, haviam vários reinos antigos, que jamais haviam tido contato com o mundo do outro lado do Saara.

Um desses reinos era o Congo. Muito antigo, monárquico, com uma forte estrutura de nobreza, poder de requisição de tributos de reinos menores, moeda representativa e tudo mais, foi um dos primeiros a ter contato com os europeus e a permitir um entreposto de navegação.

Eles nunca haviam tido contato com um ser humano de pele branca na vida. Alem disso, eles não navegavam.

A água era, na cultura deles e ainda hoje é para alguns de nós um local místico e espiritual (se você ja pulou sete ondinhas na praia, ou já deixou oferenda, sabe do que eu estou falando). Eles não viajavam por mar, e como estavam cercados, por um lado, pelo maior rio em fluxo de água no mundo e do outro pelo oceano, acabavam não se aventurando muito longe

O mar era chamado Calunga, O mundo dos mortos, onde a deusa Iemanjá cuidava dos antepassados dos congoleses. Vem daí a tradição de deixar oferendas no mar, de seus descendentes da Umbanda. Por falar nisso, a cor branca já era a cor do espiritual e do religioso, usados em seus rituais e orações desde essa época.

Pois bem.

Uma bela e fatídica manhã, os congoleses vêm chegar do meio de Calunga uma oferenda gigantesca, e dentro dela, pessoas com a pele da cor do espiritual.

Você pode imaginar o alvoroço que foi. Os congoleses ficaram felizes de mais, fizeram festas, tentaram aprender mais sobre os brancos, aprender a língua, por que achavam que eram ou tinham alguma relação com seus antepassados.

Os portugueses, já acostumados a mania de grandeza, achavam que sua superioridade havia sido reconhecida, e que aquele povo estava se colocando a seu dispor.

Levaram anos para que ambos entendessem o que ocorreu, e talvez os portugueses jamais tenham aceitado a verdade da confusão, mas daí surgiu um relacionamento forte de comércio. Os portugueses traziam tabaco, cachaça e outras especiarias produzidas na colonia, e entre outras coisas, levavam de lá linho e escravos.

Os reinos da África tinham sistemas de escravos que lembravam de forma distante o romano. Escravos podiam ser pessoas endividadas, prisioneiros de guerra ou criminosos.

Conforme os europeus percebiam que era mais fácil levar um africano de fora para trabalhar em uma terra que não conhecia, do que tentar escravizar um índio que já conhecia as florestas de cór, para fugir ou lutar, a demanda de escravos negros aumentava.

Os congoleses passavam a fazer caravanas para caçar tribos menores e mais isoladas do meio do continente, e até faziam guerra apenas para acumular escravos a serem vendidos pelos altos preços que os portugueses pagavam

Foi só quando os próprios homens e mulheres do congo passaram a ser vendidos como escravos de forma ilícita que o governante percebeu que o comércio já não era mais comércio

Várias comunidades e portos comerciais ao longo da costa ocidental da África tinham se transformado em colônias de extração de escravos, algumas nas quais os próprio europeus subjugavam os africanos e os levavam embora.

Os reinos já estavam tendo dificuldades para se defender dos portugueses, tentaram se unificar contra os portugueses, mas não havia mais estabilidade. Ao longo dos séculos, outros europeus passaram a vir colonizar a África, de pedaços em pedaços, até que, já no século XIX a corrida rumo ao centro do continente africano se tornou uma febre, e o continente foi repartido e dividido como uma pizza entre os países europeus.

E se você pensa que é culpa dos africanos por se venderem como escravos, lembre que assim como você não é apenas um branco, mas se considera um brasileiro, espanhol, português, talvez até carioca, gaúcho ou paulista, eles não se consideravam apenas africanos, mas congoleses, iorubas, etíopes etc...

Essa história não é para ser julgada, mas para ser lembrada, e para aprendermos a usar nosso passado como experiência de verdade.

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